quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Professor Ruy Luís Gomes (1905 - 1984)


Em 27 de Outubro de 1984, falecia o Professor Ruy Luís Gomes.

Em 29 de Outubro, os seus despojos mortais, após uma permanência de algumas roras no Salão Nobre da Faculdade de Ciências, onde foram velados por sucessivos turnos de docentes, de estudantes, de trabalhadores, de amigos, e de antigos companheiros de lutas democráticas, saíram acompanhados a pé, para o cemitério do Prado do Repouso, ficando depositado em jazigo de família.

O funeral foi uma impressionante demonstração de quanto era querido e respeitado pelo povo do Porto e constituiu, por si só, uma sentida e inesquecível homenagem ao matemático, ao professor e ao combatente pela Democracia e pela Paz. O Professor Alberto Amaral, da Faculdade de Ciências, o Professor Óscar Lopes da Faculdade de Letras, a Engenheira Virgínia Moura e outros oradores, nos discursos que proferiram junto ao jazigo, recordaram alguns factos e aspectos mais relevantes da sua vida de professor, de cientista e de cidadão.

Nascido no Porto, em 5 de Dezembro de 1905, foi estudante da Universidade de Coimbra, onde obteve a Licenciatura em Ciências Matemáticas e, logo em seguida, o grau de doutor, defendendo a tese “Desvio das trajectórias de um sistema holónomo”, em 1928. No ano seguinte foi nomeado, mediante concurso, Assistente do 1º Grupo (Análise e Geometria) da 1ª secção (Ciências Matemáticas) da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto. Em 1930 -1931, foi encarregado da regência da cadeira de Física – Matemática e, em 1933, ascendeu a professor catedrático, em concurso de provas públicas, onde apresentou a dissertação “Sobre a estabilidade dos movimentos dum sistema holónomo”.

Como director do Gabinete de Astronomia, promoveu a instalação de um Observatório Astronómico escolar no Monte da Virgem.

Deve-se-lhe a criação do Centro de Estudos Matemáticos do Porto, anexo à Faculdade de Ciências, em Fevereiro de 1942. Como Director do Centro, incentivou a criação do “Seminário de Física Teórica”, que funcionou anexo ao Centro, sob a direcção de Guido Beck e, posteriormente, sob a direcção de A. Proca.

Procurou obter autorização para a fixação em Portugal de Físicos e Matemáticos de alta qualidade, refugiados de países ocupados pelas tropas nazis. Motivos de ordem política governamental impediram que se aproveitasse esta oportunidade para conseguir a colaboração desses cientistas na luta contra o atraso científico do nosso País.

Colaborou na criação das revistas “Portugalie Mathematica” (destinada exclusivamente à publicação de trabalhos de investigação matemática) e “Gazeta de Matemática” (destinada essencialmente à publicação de trabalhos de divulgação matemática).

Colaborou na fundação da “Sociedade Portuguesa de Matemática” e na fundação da “Tipografia Matemática”, especialmente criada com o objectivo de facilitar a publicação de trabalhos científicos.

Juntamente com Mira Fernandes e António Monteiro, fundou a “Junta de Investigação Matemática” e foi co-fundador da colecção de publicações “Cadernos de Análise Geral”, patrocinada pela Junta.

Foi demitido, por motivos políticos, em 1947. Por iniciativa do Professor Sarmento Beires, o Conselho Escolar da Faculdade de Ciências aprovou, por unanimidade, uma resolução em que manifestava a mágoa que sentia pelo afastamento do Professor Ruy Luís Gomes, o altíssimo apreço em que tinha o seu carácter “as suas invulgares qualidades de investigador e de trabalhador incansável, seu prestígio científico e os imensos serviços prestados à Faculdade”.

Após várias perseguições políticas, que incluíram prisões pela PIDE, julgamento e condenações nos Tribunais Plenários de Lisboa e Porto, viu-se forçado a aceitar proposta de contrato para ir trabalhar para a Universidade de Bahia Blanca, na Argentina, em Setembro de 1958, onde colaborou com António Monteiro na formação de quadros docentes universitários.

Em 1962, passou para Recife, onde j+a se encontravam outros professores portugueses exilados – A. Pereira Gomes, Zaluar Nunes e José Morgado – com quem colaborou, ensinando no Curso de Matemática, preparando pessoal docente universitário, fazendo investigação científica e orientando assistentes e bolseiros. Participou na preparação matemática dos futuros físicos da Universidade Federal de Pernambuco. Foi, durante vários anos, coordenador dos cursos de pós-graduação em Matemática. Ensinou nos cursos de Mestrado em Matemática. Foi co-fundador da colecção de publicações “Notas e Comunicações de Matemática” (reservada a trabalhos de investigação matemática) e também da colecção “Notas de Curso” (destinada à publicação de cursos de pós-graduação).

Regressou a Portugal após o 25 de Abril.

Desempenhou as funções de Conselheiro de Estado.

Após a sua aclamação como Reitor da Universidade do Porto, durante a manifestação popular de regozijo pelo seu regresso, foi oficialmente nomeado Reitor. Foi Presidente da Comissão Instaladora do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar. Durante o seu reitorado foi enriquecido o património da Universidade: doação à Universidade do Porto, pela fundação Gulbenkian, da Casa – Museu Abel Salazar e doação, pelo Dr. Pedro Veiga, da sua biblioteca compreendendo dezenas de milhar de volumes.

Após a sua jubilação, em 5 de Dezembro de 1975, continuou ainda durante algum tempo dirigindo um seminário de “Teoria das Funções de Variável Complexa”, continuou a trabalhar na instalação do Instituto de Ciências Biomédicas e continuou a presidir aos trabalhos da Fundação Abel Salazar.

Por um dos trabalhos que elaborou sobre “Teoria da Integração”, foi-lhe atribuído o Prémio Artur Malheiro 1953, pela Academia de Ciências de Lisboa.

Pelos serviços à Universidade do Porto, durante o seu reitorado, foi-lhe atribuído, pelo Ministro da Educação, no dia do seu jubileu, o título de Reitor Honorário da Universidade do Porto.

Pela sua actividade no Recife, como professor da Universidade Federal de Pernambuco, foi-lhe atribuída uma medalha pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

Pela sua luta pela Democracia e pelas perseguições que sofreu, o Presidente da República Portuguesa conferiu-lhe, em 5 de Abril de 1981, o grau de Grande Oficial da Ordem da Liberdade.

José Morgado